quinta-feira, 9 de agosto de 2012

Entrevista: Quatro décadas de plantio direto no Brasil




Em 6 de agosto, na cidade de São Paulo (SP), ocorreu o 11º Congresso Brasileiro do Agronegócio, realizado pela Associação Brasileira do Agronegócio (Abag). O evento reuniu grandes experts do agronegócio brasileiro e, neste ano, homenageou Hebert Bartz, produtor agrícola introdutor do sistema de plantio direto no Brasil. Para falar sobre a importância desse sistema, que esse ano completa quatro décadas no País, entrevistamos Antonio Roque Dechen, professor do Departamento de Ciência do Solo (LSO), da Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz". Dechen é vice-reitor executivo de administração da USP e presidente da Fundação Agrisus, Agricultura Sustentável.

Comente o início do sistema de plantio direto
Nos anos 70, no Paraná, o agricultor alemão Herbert Bartz começou a estimular o chamado plantio direto na palha, sistema de aumento na cobertura do solo que impede o escorrimento da água e a perda da mesma. Na época, foi um processo difícil, mas hoje o Brasil conta com mais de 35 milhões de hectares cultivados dessa maneira. Toda a área cultivada com soja no Paraná e no Mato Grosso utiliza-se desse sistema. Pode-se dizer que o Brasil ganhou muito com a adoção desse tipo de cultivo que está completando ano 40 anos.

Quais são as principais vantagens desse sistema para o agricultor?
Entre os ganhos estão a economia do solo, a diminuição do sistema erosivo, o fato de não ter queimas, a melhora das condições de física e de fertilidade do solo e também da parte microbiológica do solo. A principal vantagem para o agricultor é manter a sustentabilidade, não só da produção, mas também da sua propriedade. A partir do momento em que o agricultor não tem um manejo adequado e há o processo de erosão, ele está perdendo algo que a natureza leva centenas de anos para produzir que é um milímetro de solo no seu sistema de formação. Isso leva muitos anos e se perde facilmente em uma grande enxurrada.

No início, o sistema de plantio direto teve alguns entraves. Entre eles estava a questão de adequação de máquinas agrícolas?
Exatamente, já existia uma tecnologia, uma padronização dos tipos de máquinas e, de repente, foi preciso mudar toda essa estrutura. Além disso, há necessidade de novas técnicas de manejo, como o cuidado com a queima, devido à maior quantidade de palha sobre o solo. De repente, uma pequena fagulha pode ocasionar uma queima enorme e um prejuízo muito grande. O Brasil tem que se prevenir. Afinal, temos hoje, em algumas regiões, principalmente no sul, áreas que estão desertificadas pela intensa utilização agrícola e pela não reposição dos vegetais, que geram aspectos erosivos. Depois, para fazer essa recomposição é muito caro e demorado. Para sermos competitivos, internacionalmente, precisamos oferecer qualidade no material que estamos produzindo.

Todas as culturas vão bem com plantio direto?
Todas as culturas anuais, de uma forma geral, vão muito bem.

Esse é um sistema que usa menos água?
Na realidade não é que ele use menos água, mas é que, a partir do momento em que você tem uma cobertura de palha de 20, até 30 cm, a incidência dos raios solares não vai atingir diretamente o solo, diminuindo a evaporação, além de não haver o escorrimento. Quando você não tem o solo coberto, a água vai escorrer e arrastar partículas de solo.

Quais foram as principais culturas que adotaram esse sistema de plantio direto?
Primeiro o algodão e depois a soja. O algodão porque, na década de 1970, era uma cultura de grande escala no Paraná e em São Paulo. Na época, nós não tínhamos soja, sua cultura estava no início. Eu me formei em 1973 e tive poucas aulas e informações sobre ela. O café, o algodão e a cana eram as culturas de grande impacto na época.

O sistema de plantio direto ganha força porque ele é bom de fato ou porque, a partir da década de 1970, o mundo todo passou a falar de sustentabilidade na indústria, nas relações humanas, no consumo, na emissão de lixo e gases tóxicos?
A sustentabilidade é o carro chefe. Mas, não existe sustentabilidade se não existir retorno comercial. O agricultor não vai aceitar ter prejuízo na sua produção. Hoje o plantio direto é aceito e aplicado porque, além da sustentabilidade, ele é rentável para os produtores. Esse é o foco. O agricultor está consciente desse fato. Participei na semana passada, em Passo Fundo (RS), da reunião da Federação Brasileira de Plantio Direto na Palha, que contou com 600 participantes, a maioria agricultores, todos ávidos por novidades e inovações de como fazer para continuar ampliando seu sistema de plantio direto. Em estados como Paraná e Mato Grosso isso é rotineiro e muito bem adotado. As empresas fabricantes de máquinas agrícolas já tem o seu cenário voltado pra isso.

Além do plantio direto, que outros sistemas agrícolas pode destacar?
Atualmente, há uma grande evolução no chamado sistema de integração lavoura-pecuária, por meio do qual há a renovação de áreas "degradadas". Nele, utiliza-se o processo da produção de gado para recomposição de solo.

A comunidade científica tem se aproximado dessa evolução no campo?
Em São Paulo, existe um grupo de pesquisadores coordenado pelo professor José Otávio Machado Menten, do Departamento de Fitopatologia e Nematologia da ESALQ, chamado Conselho Científico para Agricultura Sustentável, cujo objetivo é disseminar boas práticas agrícolas e trabalhar para a disseminação da tecnologia. Além disso, existe um programa feito pelo pesquisador André Pessoa, o Rally da Safra, que percorre todas as regiões produtoras de soja e de milho fazendo o levantamento da produção, de atividades feitas com o plantio direto, e isso tem levado o País a um cenário de inserção internacional porque a qualidade na produção agrícola passa pela qualidade na gestão do ambiente. Atualmente, os residentes da zona rural estão disseminando-se, gerando um aumento na população das áreas urbanas e na produção agrícola, que, por sua vez, deve ocorrer com eficiência, não apenas a eficiência de aumento de produção, mas com aumento da qualidade e da sustentabilidade dessa produção.

Fonte: Assessoria de Comunicação USP/ESALQ

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