quarta-feira, 10 de abril de 2013

Sem conseguir competir com gasolina, etanol clama por políticas públicas




Corriqueiramente apontada por organizações internacionais como uma das principais responsáveis pelo abastecimento energético global no futuro, a produção brasileira de etanol atualmente patina por ser incapaz de competir com a gasolina.

Segundo o analista de açúcar e energia da Informa Economics FNP, Márcio Perin, o biocombustível vive uma "crise de rentabilidade", uma vez que não tem dado retorno às usinas.

Perin lembrou que na safra passada várias indústrias venderam o produto a valores inferiores aos dos custos de produção. "Hoje, não falta etanol, mas no longo prazo preocupa, pois os investimentos são insuficientes", considerou.

Líderes do setor também estão reticentes com o futuro do etanol e acreditam que a ausência de políticas públicas seja o maior obstáculo para o crescimento. "Quem vai investir em um negócio se não sabe se vai dar retorno amanhã?", questionou o coordenador do Centro de Agronegócios da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Roberto Rodrigues, em debate no Sugar & Ethanol 2013, em São Paulo.

Na avaliação de Rodrigues, que foi ministro da Agricultura de 2003 a 2006, faltam líderes no Brasil e no mundo capazes de executar as ações necessárias para estimular a produção de etanol. "Todos têm o diagnóstico, mas ninguém faz nada. Não existe política pública para o biocombustível", afirmou. "São fundamentais a regulamentação da paridade da gasolina com o etanol e tributação e preços adequados", analisou.

"O preço da cana é formado pelas cotações do açúcar e do etanol. Se considerar apenas os valores do hidratado [utilizado como combustível], há anos a produção dá prejuízo", alertou o presidente da Organização dos Plantadores de Cana da Região Centro-Sul do Brasil (Orplana), Ismael Perina Júnior.

"A cana é um produto agrícola. Então, se o adubo, as máquinas, a mão de obra e os impostos sobem, o preço dela também se eleva", explicou o ex-ministro Rodrigues. "Quem não entende uma obviedade como essa? Dinheiro é dado para quem não precisa. Quem necessita, não tem."

Por sua vez, o preço da gasolina no Brasil é controlado pela Petrobras. Desse modo, não é tão suscetível às oscilações do mercado internacional.

O presidente do Grupo Maubisa, Maurilio Biagi Filho, declarou à Informa Economics FNP que a iniciativa deve partir dos produtores de etanol. "Enquanto ele achar que é um `coitadinho´, vai ficar sempre essa conversa de que o governo precisa fazer. O setor que tem que agir, elaborar uma legislação que seja factível e apresentar ao poder público", apontou, recordando-se do Programa Nacional do Álcool (Proálcool), criado em 1975, do qual foi um dos líderes.


Competição com a gasolina: desafio ou utopia?

Com a popularização dos veículos flex fuel no Brasil na última década, o mercado de etanolficou intrinsecamente relacionado ao da gasolina. Ao abastecer o tanque de seu carro, o consumidor pode optar entre os dois combustíveis. Por isso, o derivado da cana-de-açúcarprecisa ser competitivo para crescer e vencer a disputa com o derivado do petróleo. Porém, essa luta tem sido difícil nos últimos anos.

Em entrevista à Informa Economics FNP, a presidente da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica), Elizabeth Farina, afirmou que não é possível desvincular o mercado doetanol do da gasolina e avaliou que o atual cenário internacional favorece o combustível fóssil. "As externalidades do petróleo são negativas, e as nossas, positivas. Hoje, a gasolina é mais barata e ficará ainda mais por causa das novas fontes que serão exploradas", projetou Elizabeth. "Para nós, é um desafio, um tremendo desafio", ressaltou.

Segundo a presidente da Unica, as políticas públicas para o etanol devem criar instrumentos que reconheçam que o biocombustível "gera benefícios líquidos para a sociedade", enquanto o seu concorrente, "custos de meio ambiente e saúde".

Já Biagi Filho defende uma postura mais agressiva, que valorize os benefícios do etanol e evidencie as desvantagens da gasolina. "No mundo inteiro, o combustível fóssil poluente é sobretaxado", informou. "No maço de cigarro, está escrito `não fume, causa câncer, faz mal´. A gasolina é a mesma coisa. Se uma pessoa ligar o carro com a garagem fechada e permanecer quatro ou cinco horas no local, morre. Se for com álcool, não acontece nada."

No que tange a aspectos técnicos, o presidente do Grupo Maubisa declarou que o etanolanidro, quando misturado à gasolina, melhora a octanagem desta e a torna menos poluente, reduzindo a emissão de gases tóxicos. "O álcool é um combustível mais nobre do que a gasolina, mas, hoje, só é usado se custar menos de 70% do valor do derivado do petróleo. Nesse ritmo, caminha para virar apenas um aditivo", concluiu.


Outro lado

O assessor da Diretoria Geral da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), Luís Eduardo Duque Dutra, discorda de que as políticas públicas para a produção de etanol sejam inexistentes ou deficitárias. "Desde que a regulamentação do etanol passou para a ANP, em 2011, a entidade garante previsibilidade ao setor e estabelece uma ponte na entressafra, de modo que não haja desabastecimento no Brasil", disse.

Para Dutra, as dificuldades encontradas pelo setor ocorrem devido a fatores de mercado, que o fazem incapaz de competir com a gasolina. "O primeiro ponto é que entre uma safra e outra do biocombustível existe a entressafra. O petróleo não enfrenta esse problema", observou.

"O segundo se relaciona à escala industrial. A maior usina de álcool é projetada para produzir 30 mil barris de gasolina equivalente, enquanto as refinarias são construídas com capacidade de, no mínimo, 100 mil barris", continuou o assessor da ANP.

"E a terceira questão é que a tendência do preço da gasolina não é de elevação no mercado internacional. Em 2009, o barril estava a US$ 140. Hoje, está entre US$ 90 e US$ 110", completou. Nesta quinta-feira (4), o barril de "light sweet crude" para entrega em maio fechou a US$ 93,26 na Bolsa de Nova York (Nymex, na sigla em inglês).

Felipe Cordeiro
Fonte: Informa Economics FNP

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