quinta-feira, 16 de agosto de 2012
Hidrelétricas: polêmica envolve volta de reservatórios
O setor elétrico brasileiro está travando uma discussão de deixar os ambientalistas de cabelo em pé: a possibilidade de voltar a construir usinas hidrelétricas com reservatórios. Desde o início da década passada, diante de forte campanha de ecologistas, passaram a ser construídas apenas as chamadas usinas a fio d´água, ou seja, sem reservatório, que visam a reduzir os impactos na natureza. Só que isso, dizem técnicos e especialistas da área, está levando a um preço cada vez maior para os consumidores e, ironicamente, um aumento das emissões de gás carbônico (CO2). Dados da consultoria PSR revelam que, até o fim de 2020, com a entrada em operação das usinas térmicas, que usam energia mais suja, o volume das emissões de CO2 vai mais que triplicar em relação ao início desta década. Passará de 22 toneladas de CO2 para 72 toneladas de CO2 para cada gigawatt por hora (GWh) consumido.
O aumento nas emissões acontece porque, nos períodos secos, de maio a outubro, as hidrelétricas são obrigadas a reduzir a geração de energia, devido à menor vazão dos rios. Como não há água suficiente armazenada nos reservatórios, o sistema tem que acionar as usinas térmicas, seja a gás, óleo combustível ou carvão, bem mais caras e poluentes. Além dos impactos à biodiversidade, ambientalistas destacam que um dos impasses envolve questões como a remoção de tribos indígenas. Até projetos como Belo Monte, no Pará, Jirau e Santo Antônio, ambos em Rondônia, mesmo sendo a fio d´água, enfrentam forte oposição.
Durante a Rio+20, em junho, o Fórum de Meio Ambiente do Setor Elétrico, que reúne 18 associações ligadas ao segmento, em conjunto com a Confederação Nacional da Indústria (CNI), apresentou um documento no qual apontaram a necessidade de o país rever a construção de usinas com reservatórios. A PSR estima que, a cada 1% de perda de capacidade dos reservatórios no país, há um aumento de 23% nas emissões.
Rafael Kelman, da PSR, destaca que os reservatórios são fundamentais para viabilizar uma geração de energia mais limpa no Brasil, assim como as energias solar, eólica e a biomassa. Porém, segundo ele, essas fontes renováveis não são de energia firme, pois dependem de sol, vento e safra dacana. Assim, sem água armazenada, é preciso complementar com as térmicas:
- A discussão da volta de reservatórios é crescente, mas é preciso fazer sem estar pintado para a guerra.
Greenpeace alerta para falso dilema
Marcelo Moraes, coordenador do Fórum, também lembra que a volta de usinas com reservatórios é necessária para o país manter o elevado percentual de sua matriz energética limpa e renovável (45%). Moraes destaca que, em algumas regiões, é possível construir hidrelétricas com áreas menores de armazenamento de água, não tão grandes como as construídas entre os anos 70 e 80, como Tucuruí, no Pará.
- Há pouco mais de dez anos, o Brasil tinha o equivalente a quatro anos de capacidade de energiaarmazenada. Hoje, não chega a um ano. Tem regiões que são intocáveis, mas em muitas outras é possível construir pequenos reservatórios %4 diz Moraes.
Do outro lado, o Greenpeace critica o fato de o setor voltar a falar em reservatórios.Para Sérgio Leitão, diretor de Campanha da ONG, os empresários do setor estão criando um "falso dilema". Para ele, o ideal é estimular o desenvolvimento de energias alternativas.
Segundo as contas de Moraes, do Fórum, se fossem explorados todos os empreendimentos na Amazônia, sem considerar áreas de preservação ou indígenas, seria alagado apenas 1% da área e se permitiria uma geração de 120 mil megawatts (MW), praticamente a mesma capacidade atual instalada do país, da ordem de 110 mil MW.
A advogada ambiental Adriana Coli garante que muitos ambientalistas já admitem discutir a volta dos reservatórios, importantes para regularizar a vazão dos rios:
- Quando ocorre um período de seca muito grande, o reservatório pode liberar a água para manter a vazão do rio e com isso preservar as espécies marinhas, assim também como pode conter a água quando os rios estão cheios.
Carlos Maurício Ribeiro, especialista em direito ambiental, não vê necessidade da volta dos reservatórios, já que o Brasil tem tamanho continental, podendo aproveitar ao máximo as diversas fontes ao longo do ano:
- É possível combinar usinas a fio d´água com energia eólica numa parte do ano, e solar, em outra. Mas a energia solar ainda é muito cara.
O professor Luiz Pinguelli Rosa, diretor da Coppe/UFRJ, diz que a necessidade de se construir hidrelétricas com reservatórios nunca desapareceu. Ele diz que apoiou a construção de usinas sem reservatório, como forma de buscar um impacto menor, mas confessaque se perde muito em capacidade.
- Em 2001, quando houve o racionamento, foram os reservatórios que salvaram o Brasil. De lá para cá, deixamos de construir reservatórios. Paga-se um preço por isso, gerando energia com as térmicas. E as renováveis têm o problema de depender do sol e do vento.
Reservatórios podem ser menores
O presidente da Associação Brasileira dos Produtores Independentes de Energia Elétrica (Apine), Luiz Fernando Vianna, admite que não será fácil negociar com ambientalistas.
- O Brasil vai ter que acrescentar 3 mil MW todo ano. Cada fonte tem sua vocação. Belo Monte só vai conseguir aproveitar 41% do potencial de 11 mil MW. Como há período de secas, a usina não geraenergia o ano todo. O Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) não vai poder contar o ano inteiro com Belo Monte e as usinas do Rio Madeira, Jirau e Santo Antônio.
Procurados, o Ministério de Minas e Energia, a Empresa de Pesquisa Energética e a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) não responderam.
Ramona Ordoñez e Bruno Rosa
Fonte: O Globo
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