quarta-feira, 14 de setembro de 2011
Às margens dos trilhos, eles vivem das sobras de açúcar
Desde que os trens de passageiros pararam de circular pelos trilhos da antiga Rede Ferroviária no fim da década de 90, a população da pequena Pradópolis parece ter esquecido que ali ainda há uma ferrovia que atende a principal atividade da cidade, o açúcar. Alguns nem sabem que ALL (América Latina Logística) é o nome da empresa que opera a via. Até o Cristo Redentor, construído em 2008, num local escolhido para abraçar toda a cidade, ficou de costas para os trilhos.
A antiga estação ferroviária, construída em 1901, para atender a fazenda e a Usina São Martinho, foi invadida. Não há estatísticas de quantas pessoas moram no local, até porque a cada dia surge uma família nova. Todas são atraídas pelo mesmo motivo. Além de não pagar aluguel, luz e água, eles ainda podem conseguir açúcar para vender. Trata-se da prática de varredura, como contam os moradores.
Pelo menos duas vezes ao dia, quando os trens chegam para carregar açúcar na Usina São Martinho, eles podem entrar e limpar os vagões. Cada morador corre para reservar o seu. Quando o trem sai, eles ensacam tudo e levam para suas casas.
"O açúcar que conseguimos tirar é nosso", conta Zelita Santos, 45 anos. Segundo ela, que mora no local há dez anos, o produto é trocado por cestas básicas e outros alimentos. Alguns vendem para agricultores que fazem veneno para ser usado na lavoura.
A varredura ficou tão rentável que a população cresce a cada dia. O prédio onde funcionava a estação foi dividido por três famílias. Na falta de casa para todos, há quem tenha resolvido fazer uma casinha ao lado dos trilhos. Mas a movimentação não se resume aos moradores da antiga estação. O açúcar também tem atraído gente que só aparece quando os trens chegam.
O grande problema, relata Zelita, é que o negócio começou a ficar perigoso. Não contente com a quantidade de açúcar que conseguem tirar dos vagões, alguns estranhos resolveram roubar, conta a moradora, que trabalhou durante anos como cortadora de cana. Eles descobriram uma forma de abrir o contêiner e soltar o açúcar. Depois que o trem vai embora, eles encostam peruas e carros e levam o produto embora. "Aqui era um bom lugar para morar. Hoje tem muito estranho circulando pelos trilhos", afirma Conceição Serafim, que trabalhou 33 anos como cortadora de cana.
Fonte: O Estado de S. P.
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